Vanessa Ribeiro Psicologia

Suicídio: um grito no silêncio

E de repente a vida pesou…
Olho para os lados, procuro e não encontro sentido…
Respirar é sofrido, acordar é sofrido, tudo me parece ora dolorido, ora anestesiado.
Flutuo entre o desespero de ser quem sou e a anestesia de não ser capaz de acreditar que a vida pode melhorar.
Não posso esperar nada dos outros ao meu redor, ninguém parece ser capaz de entender o mundo onde estou, nem eu mesmo.
Solidão e vazio compõem o meu agora, diariamente me pergunto se é hoje que determino o fim da minha história.

Estamos em setembro, mês da campanha setembro amarelo de prevenção contra o suicídio. Suicídio é o termo que usamos para falar do ato deliberado de tirar a própria vida.

Trago esses pequenos versos como uma tentativa de nos aproximar de um universo de sofrimento que começa a pensar o suicídio como alternativa de fazer parar de doer. Karina Fukumitsu, psicóloga e suicidologista, afirma que o suicídio é um grito no silêncio. Em muitos momentos tudo isso é vivido em processos solitários, o que facilita chegar ao limite do “não aguentar mais”.

Não, depressão não é frescura!
Não, tentar suicídio não é apenas uma forma de chamar atenção!
Não, essa pessoa não quer fazer morrer o seu corpo, porque ela, muitas vezes, já sente ele morto.

A pessoa que quer morrer, deseja a morte dessa vida que ela está vivendo, e não necessariamente romper o seu processo de existência no mundo. O grito do suicídio, é o grito de uma vida sem sentido, que precisa encontrar nos afetos e nas sensações cotidianas uma direção diferente da que se está tomando… Que precisa ver movimento e possibilidades de transformação.

Falar é a solução!

Esse é o slogan da campanha, que traz na possibilidade da fala uma forma de legitimação de sofrimentos muitas vezes calados, menosprezados, desvalorizados, e que por isso, se tornam ainda mais pesados e insuportáveis. Ter com quem compartilhar isso que estou sentindo é abrir-me para a possibilidade de não estar tão sozinho no mundo, é saber que o que eu tenho a dizer importa, que a minha vida importa!

O nosso modo de olhar o sofrimento do outro, muitas vezes fala da forma como lidamos com os nossos próprios afetos. Se eu não me dou espaço para chorar quando o choro vem, para gritar, amar ou ficar com raiva, dificilmente será possível acolher esse processo no outro.

O tema do suicídio nos convida a olhar para o modo como estamos caminhando pela vida. Perceber-me vivendo uma morte em vida, é me dar conta de uma vida sem sentido, uma vida sem o “sentir”… Para que eu sinta a vida preciso me permitir viver os altos e baixos inerentes a ela. Do contrário, estarei sob controle, em linha reta, perfeitamente apresentável, mas distante das inconstâncias que fazem o meu coração bater.

Em algum momento esquecemos que a vida é bagunçada, ou melhor, que ela segue seus próprios critérios de organização. Canguilhem afirma que saúde é a nossa tentativa constante de equilíbrio diante do desequilíbrio próprio do processo de viver.

Que possamos ver vida abundante nos nossos desequilíbrios, e devolver sentidos que nos lembrem, diariamente, que vale a pena viver, que vale a pena continuar construindo a minha, a sua, a nossa história.

14 comments

    1. Seguimos buscando novas formas de construir beleza a partir das nossas dores… Afinal, o sofrimento está presente na história de todos nós, mesmo que em contextos e intensidades diferentes.

  1. Ótimo texto! Que as pessoas encontrem sentido em suas vidas, que consigam encontrar maneiras de serem felizes dentro de suas próprias possibilidades.

  2. Sou estudante de psicologia, já fui aluna da Vanessa, e uma dos maiores ensinamentos que me deixou em suas falas durante as aulas, é que precisamos entender nossas dores, emoções e sentimentos para que possamos entender e cuidar das dores, emoções e sentimentos do outro. O processo de autoconhecimento e o fato de se permitir sentir, é fundamental para o acolhimento do outro. Excelente texto, como sempre com grandes ensinamentos e questionamentos. Meus parabéns pelo trabalho Vanessa.

    1. Mayara, querida. Fico feliz que nossos encontros tenham feito sentido para você! Que seja apenas o início da sua linda história na psicologia!

  3. Excelentes colocações sobre algo que realmente é real e abafado por muitos meios de comunicação. Parabéns pela iniciativa de mostrar a realidade de tantas pessoas não compreendidas!

  4. Prof. Vanessa como sempre compondo reflexões que mais se parecem com poemas inundados de verdades, sensibilidade. Lançar o olhar sobre uma temática tão delicada como o suicídio de forma a se sentir a dor do outro é um desafio que foi muito bem expressado nestas linhas. Muito obrigada Prof. Vanessa!

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