Será que eu sou o bastante?
Eu não me preparei o bastante para a apresentação.
Eu não sou um pai bom o suficiente.
Não sou bonita o bastante para isso.
Não sou corajoso o suficiente para aquilo.
Não aproveitei suficientemente o momento!
Frases como essas pipocam cotidianamente na nossa cabeça, nos fazendo olhar para o que falta. É isso que se torna protagonista, a falta e não o que pode ser, o que pude viver, o que consegui fazer. Vemos sempre a metade vazia do copo, e esquecemos de nos gratificar pela metade que conseguimos preencher.
Talvez a falta não seja o problema, ela pode ser um convite para tentar mais, fazer diferente ou até mudar de rumo. O problema é quando a falta deixa de ser um detalhe e passa a ser tudo o que conseguimos ver.
Certamente muitas pessoas faltaram pra você, muitas não puderam dar tudo o que você precisava, nos momentos em que precisou. Do mesmo modo você, possivelmente também faltará para muitas pessoas. Às vezes simplesmente não temos a dimensão do quanto o outro precisa de nós, e tudo bem… As faltas fazem parte da vida e deixam espaços por vezes bem difíceis de preencher.
Mas sabe o que é extraordinário nesse processo? Os convites que as faltas nos trazem.
O primeiro grande convite é repensar o critério do que entendo como “suficiente”:
o que é não ser bonita o suficiente? Em que critério de beleza estou me baseando? Ele de fato faz diferença pra mim?
“Não aproveitei o suficiente!”Se estive do modo como eu pude naquele momento, será que isso não foi o bastante naquele contexto?
Geralmente, ao reavaliar os critérios conseguimos escapar aos padrões e avaliar a partir das nossas reais necessidades.
O segundo convite da falta é o preenchimento.
Quando eu era criança, uma folha em branco ou um espaço vazio no caderno era sempre um convite para desenhar. Se esse espaço fossem minutos a mais no recreio ou um intervalo entre as aulas o convite era para brincar… e sempre brincávamos com o que tínhamos, não costumávamos lamentar o que não estava ali, só queríamos aproveitar os recursos disponíveis e nos divertir com eles. Dali saíam pega varetas com lápis de cor, barcos de papel…
O nosso adultescimento nos fez esquecer do quanto pode ser desafiador e divertido preencher espaços vazios. Talvez não consigamos preenchê-los da forma como gostaríamos, e por isso para se divertir com essa brincadeira precisamos deixar a comparação de lado, e só viver as possibilidades do agora.
Por exemplo, se eu penso que se eu estivesse tido o apoio do meu pai nisso, tudo seria diferente. Eu continuo olhando para a falta, torna-se uma relação entre o que eu não tive e o que eu continuo não tendo.
Em contrapartida, se eu olho para tudo o que eu consegui apesar dos apoios que esperei e não tive, fico com a minha capacidade de criação em meio a situação de restrição.
Isso não tem nada a ver com perfeições e imperfeições, tem a ver com sua capacidade de superação.
Ser um pai amoroso, quando se vem de uma relação amorosa com o seu pai pode ser uma tendência, uma vez que costumamos reproduzir os exemplos de relações que vivenciamos.
Mas ser um pai que busca constantemente ser mais amoroso, quando a minha história com o meu pai é marcada por violências e abandonos, torna-se um desafio diário e um lindo processo de superação pessoal.
Novamente, isso nada tem a ver com ser melhor ou pior do que os outros pais que você conhece, isso tem a ver com aproveitar as faltas da sua história para construir formas diferentes de se relacionar. Não porque isso é o certo a se fazer, mas porque você e os seus filhos merecem viver o melhor possível, simplesmente isso.
Desejo que suas faltas sejam convites especiais de reflexão e reinvenção.
Lembre-se: isso não é sobre você em comparação com o outro, mas sobre poder viver o melhor, o que de fato importa, a cada dia.
É o dá o nosso melhor com as coisas que temos, é buscar melhorar por causa de nós mesmos e não por causa do outro. Mas lhe confesso que é difícil, ao nós tornarmos adultos muitas vezes nos cobramos de uma forma que não é sadia e não percebemos.
Exato, Gustavo. Não é um processo fácil… Por isso é importante olhar para a nossa história e entender inclusive a nossa história de cobranças para a partir daí conseguir reavaliá-las.
Olá Prof. Vanessa boa noite! Obrigada por compartilhar esta riqueza de reflexão.
Fico feliz que o texto tenha feito sentido para você, Ruth!
Muito bom !!! Amei !
Fico feliz que tenha gostado, Fabrícia! 🙂
Exatamente, nos falta gratidão pelas conquistas. Muitas vezes apenas brigamos e nos questionamos pelas faltas que marcam presença em nossas vidas, tão agitadas e tão raras de contemplação pelo belo, pelo encantador, pela natureza e perdemos muito tempo com quê “acreditamos” nos fazer falta.
Concordo Vilma! Em muitos momentos é preciso olhar para o quanto já caminhamos, para o valor da história que construímos até aqui, porque é nesse momento que resgatamos a nossa potência para continuar o percurso.
Que texto incrível e abastecedor de bons sentimentos. Adorei Vanessa, você e o seu dom de trazer simplicidade a assuntos complexos! Parabéns pela iniciativa ♥️
Obrigada pelo carinho, Larissa! s2
Muito linda a reflexão!!
Queria que tempos comuns nunca faltassem.
Hoje é tudo tão superficial. Parece que se mostrarmos os nossos sentidos de fato somos taxados como careta ou fora do contexto.
Concordo com você Joyce, demonstrar afeto e emoções tem sido um desafio nesses novos tempos… Mas entendo que esse desafio vale a pena. Seguimos tentando 😉
Lindo texto! Adorei!!!
Fico feliz que tenha gostado! 🙂
“Mas ser um pai que busca constantemente…”
Essa frase mexeu comigo.
Nei, espero que essas palavras tenham produzido boas reflexões para você! 🙂
Boa noite, Vanessa! Muito bom o seu texto!
Fiquei pensando aqui. As faltas podem trazer junto o que esperamos de determinada pessoa ou de tal situação. E, talvez, lidar com as faltas é também lidar com as expectativas que criamos serem quebradas. Na falta que tive por parte de uma pessoa, talvez mostre a expectativa que criei sobre ela, e ela talvez nem tenha se comprometido com o que eu esperava dela. Ela estava sendo apenas ela.
E, como é lidar com isso também na situação em que o outro espera da gente, e a gente falta para o outro. Eu fico imaginando uma situação de trabalho (pegando o gancho de ter falado de quando somos adultos), como é lidar com a cobrança de algo que não damos a algum superior no trabalho e isso faz a gente pensar que faltou algo, que faltou alguma coisa, que a expectativa do outro não foi preenchida por mim. E, como isso me afeta? Talvez isso traga memórias do passado em que sentimos falta de algo, de alguém, e não é fácil estar atento a isso o tempo todo. Podemos adoecer por este motivo mesmo sem perceber.
Muito interessante o seu texto, profª Vanessa! Eu dei uma bela refletida, haha.
Oi Arthur! Fiquei muito feliz em receber suas reflexões. Acho que você ampliou a discussão trazendo pontos muito interessantes. De fato, estamos sempre precisando entender o que é nosso, aonde essas situações estão nos afetando. Gratidão por compartilhar aqui!